A responsabilidade das marcas sobre os problemas da indústria de comunicação

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Você já percebeu como o comportamento das pessoas mudou em relação às peças publicitárias nos últimos anos? Vamos pensar na indústria cervejeira, por exemplo. Em toda sua história moderna, as maiores marcas do país objetificam o corpo da mulher, mesmo em um tempo em que isso já era questionado em uma pequena medida, né. E hoje, não fazem mais isso (diretamente), temos um grande avanço.

Isso mudou porque, em algum momento, isso se tornou insustentável a partir da cobrança da própria sociedade, né? Isso aconteceu com toda a indústria. E também deslocou a forma como a gente faz propaganda, levando em conta (agora, de verdade) as pessoas para quem falamos, para as representarmos da forma correta, como elas esperam serem representadas.

Ou seja, a cobrança da sociedade civil é um dos mecanismos que mais faz a publicidade se atualizar. São inúmeros os casos que surgem. Vamos olhar pra dois casos clássicos?

O que já aconteceu

Você deve lembrar da trágica campanha de Skol, do “deixei o não em casa”. Ela é tão absurda que vocês vão me permitir não reproduzi-la aqui. Mas fato é que, de lá pra cá a Skol mudou radicalmente seu posicionamento, com campanhas como “Reposter” e “Skolors”, por exemplo. Isso é um exemplo da sociedade cobrando as marcas.

Tem um outro caso diferente, das MARCAS cobrando as suas agências. Lá por 2017, a HP enviou um comunicado a todas as suas agências e fornecedoras de comunicação, dando metas de inclusão e representatividade, para que continuassem sendo fornecedoras da marca no futuro, do contrário, não poderiam continuar.

Veja, é muito lógico: as marcas passam a ser cobradas pela sociedade, LOGO, as marcas cobram suas agências, né? Mas e o contrário? As agências não podem cobrar marcas e responsabilizá-las também pelos problemas do mercado?

A responsabilidade das marcas

Dia desses eu vi esse tweet e ele motivou esse artigo.

Print de tweet de @carollinesarda escrito "Se a galera da área da Comunicação expor tudo que já viu enquanto trabalha... Vários ídolos serão destruídos kkkkkkkkkkkkk"

Aqui eu comecei a pensar, quanto tempo vai levar para que essas duas instâncias de cobranças – as agências e a sociedade civil –, comecem a cobrar as marcas pelos problemas que elas causam na indústria de comunicação.

Vamos lá: jornadas excessivas de trabalho. A romantização da pressão. Briefings com uma urgência desmedida. Noites viradas sem qualquer razão evidente. Assédio moral vindo especialmente da marca em reuniões e tudo mais. 

E não pense apenas em problemas visíveis em momentos específicos. Estamos falando aqui também de micro agressões do dia a dia. Por exemplo, silenciar uma mulher que está falando em uma reunião. Fazer valer sua vontade, contrariando dados específicos apresentados por especialistas. Pedir que determinada pessoa seja afastada do projeto por ter sido contrariado. Todas essas são atitudes não raras nessa relação entre marca e fornecedores, puramente por possuírem, naquele momento, o poder de quem paga.

Claro, veja, assim como toda indústria, a publicidade também está inserida em relações de poder. Isso quer dizer que, invariavelmente, quem está com o poder na mão (ou no bolso) vai poder demandar mais. E esse poder, se for uma pessoa não preparada para tê-lo, também acaba gerando esse tipo de problema no mercado de comunicação.

Por mais que eu também não goste dessas separações acadêmicas, existem os problemas da indústria de publicidade que são A) financiados pelas marcas, e aqueles que são B) causados pelas marcas. 

Por exemplo, você trabalha para uma agência que te cobra a virar uma noite para receber um prêmio. Essas inscrições, a premiação, é financiada com dinheiro das marcas. Mas não necessariamente elas são uma exigência das marcas. Muito desse problema é dividido com a agência. 

Agora, um briefing que entra urgente de hoje para amanhã, que na verdade foi só mais um prazo definido por alguém sem qualquer razão. Ou mesmo um abuso de poder em uma reunião que menospreza uma pessoa. Ou um profissional que adquire burnout atendendo exclusivamente uma marca dentro da agência. Esses problemas, são sim, responsabilidades das marcas. 

Então, voltamos a pergunta inicial: se marcas são hoje cobradas pela sociedade por suas linhas de produção que usam mão de obra análoga a escravidão, por exemplo. Se são cobradas pela degradação do planeta… quanto tempo elas vão levar para serem cobradas pelos problemas laborais que causam nos parceiros de negócio de comunicação?

Me peguei aqui pensando quantas pessoas são responsáveis por esses problemas, e que são ovacionadas em festivais e eventos. E veja, sem uma cobrança excessiva, porque na maioria das vezes, todas elas são cúmplices e vítimas desse sistema, ao mesmo tempo. Uma pessoa que abusa de poder sobre outra nessa indústria de comunicação, também já foi vítima de um comportamento abusivo. Como romper esse ciclo?

Não há uma resposta fácil

Eu queria poder neste artigo encontrar uma resposta mais fácil e rápida para esse descompasso na nossa indústria. Contudo, algumas vezes eu já tentei discutir lá no meu podcast com marcas a sua responsabilidade compartilhada com agências sobre esse problema, mas foram pouquíssimas as que toparam.

Reconhecer o seu lugar ativo como parte do problema é a primeira etapa no processo de transformação dos problemas. Enquanto essas marcas não forem ativamente atuantes na dissolução dessas pressões e micro agressões cotidianas, muito pouco avançaremos.

O ponto central desse artigo é entender que, esse processo ativo e voluntário de rever suas dinâmicas e relações com seus parceiros de negócio, se não forem iniciados pelas marcas, serão iniciados em breve pela própria sociedade civil, que também não irá compactuar com esse tipo de prática no espírito do tempo que vivemos e buscamos hoje.

E que veja você, é o mesmo espírito do tempo que as marcas defendem no intervalo comercial, em seus anúncios, mas que também não conseguem agir da porta pra dentro. 

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