Nem toda agência tradicional é ruim. O problema não está no nome

Capa para artigo de Lucas Schuch sobre agência tradicional
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O que conhecemos por agência tradicional é aquela clássica divisão de áreas: atendimento, planejamento, mídia e criação. Por vários anos esse foi o único modelo de agência vigente. Ou pelo menos, o mais comum globalmente. O modelo de agenciamento de espaços de mídia, as duplas criativas, o modelo de ganhar dinheiro dessa indústria. Tudo isso caracterizou o que a gente conhece por tradicional nessa indústria. 

Pós era da transformação digital, ali pelos anos 2000, vimos surgir um monte de “agências digitais”. E avançando mais uns anos, ali por 2015, vimos surgir inúmeros outros modelos de negócio. E o mercado desenvolveu algo que vou chamar aqui de “Bode do Tradicional”.

Novas metodologias de trabalho, sprints, co-criação, modelos de remuneração, equipes genuinamente proporcionais a demografia do Brasil, e uma íntima ligação com tecnologia e ideias futuristas. Pronto, já que todo frescor do mercado estava vindo dos novos modelos, as agências tradicionais viraram o saco de pancadas bom de bater.

Tradicional x Conservador

Com o surgimento destes novos modelos de negócio, vários deles vieram com propostas de romper com práticas tóxicas que o mercado de publicidade carrega. A gente pode começar pela pesquisa do Grupo de Planejamento em 2017, que deflagrou índices altíssimos de assédio moral e sexual em agências de publicidade de São Paulo. Jornadas excessivas de trabalho, com duração de 10h, 12h, 14 horas ininterruptas. Trabalhos aos finais de semana, desigualdade salarial e vários problemas que atingem essa indústria, ficaram muito associadas às empresas tradicionais. 

A matemática nesse caso me parece simples: o rótulo de conservador colou automaticamente nos modelos que a gente chamava de tradicional. Ao passo que os novos modelos de negócio, agências que surgiram após 2010, ficaram com o rótulo de progressistas, desconstruídas. 

Primeiro eu preciso dizer que, além de entender o porquê isso ocorre, de fato, estatisticamente vemos mais casos desses problemas rolando em agências que estão no mercado há mais tempo. Estamos falando de empresas que, dependendo, estão aí há mais de 100 anos. E isso dificulta que alguns problemas de cultura sejam resolvidos (aqui não estamos falando dos problemas da esfera criminal, que devem ser resolvidos imediatamente, óbvio).

O que eu quero te dizer com isso é: empresas maiores, que estão há mais tempo no mercado, tem mais dificuldade de adaptar sua cultura, que uma empresa que cria sua cultura do zero, recentemente. E isso é um importante direcionamento de carreira. Mas não significa dizer que todas as agências tradicionais são péssimas, e que todas as “alternativas” são perfeitas. 

Você está passando pano para as tradicionais, Lucas?

Eu tenho escutado muito essa frase ultimamente rs. Mas porque é importante tirarmos o bode de agências tradicionais? Porque nem toda agência tradicional se mantém conservadora. Dissociar esse estigma é importante, porque agências alternativas não vão ter recursos para absorver toda a massa de profissionais do mercado. E agências tradicionais vão sempre se manter como empregadores majoritários nesta indústria. 

Além disso, algumas agências, só porque tem aquela divisão estrutural das áreas que comentamos no início, são chamadas de tradicionais. Mas estas possuem ótimas iniciativas de ruptura com os problemas estruturais do mercado de publicidade. Iniciativas de representatividade e inclusão, boas práticas em relação a horários livres, debates sobre saúde mental, surgem em agências tradicionais, e que depois passam a inspirar o resto do mercado.

E também é nessas empresas que estão nossos colegas e, por várias vezes, amigas e amigos que estão tentando fazer um trabalho que responda ao espírito do tempo. Esse bode que a gente pode ter reforçado por muito tempo, hoje em dia, eu sinceramente não sei se ajuda muito mais. 

Veja bem, isso não significa não cobrar

Por fim, isso não significa não jogar olhar crítico para agências, ditas, tradicionais, tá bom? Ou seja, não continuar cobrando melhores práticas, respeito aos profissionais, jornadas saudáveis de trabalho. Isso precisa continuar acontecendo, e em alguma medida, para elas a cobrança vai ser ainda maior, pois as reparações que elas precisam fazer também é maior, proporcional ao seu histórico.

O que a gente precisa fazer é encontrar um meio do caminho saudável entre a cobrança por transformações e um bode gratuíto que podemos ter direcionado pra essas empresas.

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