No Brasil, poucos conceitos são tão mal compreendidos – e confundidos – quanto a diferença entre marketing e comunicação. Pode parecer assunto batido para quem vive o mercado, mas a confusão ainda reina, especialmente em um país que respira criatividade e ostenta campanhas premiadas em festivais pelo mundo.
E justamente por sermos referência mundial em propaganda criativa, acabamos misturando funções e conceitos fundamentais para o crescimento real dos negócios. Essa confusão impacta diretamente na alocação de recursos, na definição de KPIs (Key Performance Indicators) relevantes e, consequentemente, nos resultados alcançados.
Sou publicitário, formado com orgulho em Publicidade e Propaganda. Mas preciso ser honesto: pouca coisa do que aprendi na faculdade corresponde à rotina que enfrento no mercado. Isso não diminui o valor da formação acadêmica – que moldou minha base intelectual e meu olhar sobre o consumo, comunicação e jornada do consumidor.
No entanto, ao contrário do que muitos ainda pensam, marketing e propaganda não são sinônimos. E, curiosamente, é aqui no Brasil que essa mistura acontece com mais frequência. Um exemplo prático dessa confusão é a crença de que uma campanha viral no Instagram é, por si só, uma estratégia de marketing bem-sucedida.
Marketing é estratégia
Na última semana, em um evento que participei em Fortaleza para empreendedores e gestores, a tão aguardada palestra de Felipe Hatab trouxe à tona esse “óbvio”: marketing é estratégia, não é só criatividade, nem post bonito no Instagram ou acompanhar trends do TikTok. Antes de falar de CPC (Cost Per Click), CPM (Cost Per Mille) e engajamento, é preciso falar de custos, despesas, EBITDA (Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization) – de negócio.
Comunicação é sobre pessoas; marketing, sobre estratégia e mercado. Pense no marketing como o maestro de uma orquestra, e a comunicação como um dos instrumentos. Sem a partitura (estratégia), o som pode ser bonito, mas não cria uma sinfonia.
Os números do mercado comprovam como a prática, muitas vezes, diverge do conceito. Segundo levantamento da RD Station, 94% das empresas brasileiras aproveitam o marketing digital como estratégia de crescimento, mas apenas 33% definem metas integradas entre marketing e vendas. Em outras palavras: a maioria ainda enxerga o marketing como ferramenta de comunicação, não como pilar estratégico do negócio.
Isso explica, inclusive, por que 75% das empresas não atingiram suas metas de marketing em 2022. Falta direcionamento estratégico, sobra foco em likes. Um exemplo claro é uma empresa que investe pesado em anúncios online, mas não possui uma landing page otimizada ou um funil de vendas bem definido.
É importante lembrar a raiz do conceito. Lá atrás, Kotler já nos dizia: publicidade, mídia, tráfego, redes sociais – tudo isso são apenas um dos “Ps” do marketing, o famoso P de promoção. Quem quer realmente viver e liderar no marketing precisa, sim, entender de comunicação, mas, sobretudo, mergulhar em preço, praça e produto.
Não temos mais espaço para uma liderança de marketing que se restringe a posts e campanhas; precisamos de gestores que analisam mercado, estudam dados e orientam o posicionamento da empresa de forma integrada. Isso significa entender a fundo o Product-Market Fit, analisar dados de CRM (Customer Relationship Management) para identificar padrões de comportamento do consumidor e ajustar a estratégia de acordo.
O óbvio precisa ser dito sobre marketing e comunicação
O cenário brasileiro, no entanto, ainda é o oposto. Vemos gerentes de marketing desempenhando papéis de diretor de arte, mídia ou social, e não raro são confundidos com community managers. Esse desvio fica evidente quando apenas 52% dos líderes de marketing no Brasil declaram conseguir demonstrar o valor estratégico da área para o restante da companhia. Imagine um cenário onde o departamento de marketing não consegue justificar o ROI (Return on Investment) de suas ações para a diretoria.
Portanto, por mais óbvio que seja, precisamos repetir: marketing é mercadologia, é pensar o negócio como um todo. Comunicação é uma poderosa aliada, mas não resolve tudo sozinha. É hora de contratar gestores de marketing com visão de negócio, e apoiar times de comunicação com quem entende de engajamento e storytelling. Ao invés de buscar um “faz tudo”, invista em profissionais especializados e com habilidades complementares.
Num mundo hipercompetitivo, as marcas que entenderem – e aplicarem – essa divisão óbvia, vão colher resultados melhores, mais constantes e muito mais estratégicos. Pense na Apple, por exemplo. A comunicação da marca é impecável, mas o sucesso da empresa reside na sua capacidade de entender as necessidades do mercado, criar produtos inovadores e posicioná-los de forma estratégica.
A imagem da capa foi gerada pelo ChatGPT-4o.